25.12.08

brega, mas de coração

Nessas de rever algumas das minhas posturas desde que eu comecei a escrever por aqui, eu percebi que só contestar tudo, apontando o que cada coisa tem de ruim, apenas, pode ser considerado meio infantil. Não queremos isto.
Esta idéia se aplica ao natal. Embora eu tenha passado os últimos dias malhando a data e tudo o que está a ela, direta ou indiretamente, relacionado, muito irritada que fiquei com o fato de eu levar uma hora e meia para cruzar a Av. Paulista de carro, por conta do raio do circuito das luzes que está rolando por lá, devo admitir que o natal tem aspectos positivos, sobre os quais eu passo a discorrer - já que eu não sou mais criança e posso reconhecer que há um lado bom mesmo naquilo que eu não gosto.
Eu gosto muito de comer. Talvez mais até do que de comer, eu gosto de beliscar a comida quando ela ainda é proibida. E o natal é um prato cheio (quasi literalmente) para isso. Afinal, fica lá o tender, o chester, o sushi, a farofa, a maionese, as compotas, as carnes, tudinho ali. E é aí que se liberta a artista que habita dentro de mim, arquitetando como eu vou fazer para conseguir tirar pedaços de tudo sem que ninguém perceba.
Outro bom aspecto dos natais em geral é aquela sensação de legitimidade em ser inútil. No natal, eu não preciso trabalhar, nem estudar, nem mesmo ler o livro que eu esteja lendo. Posso, por um dia, ser aquele tipo de pessoa que eu critico e digo que não quero ser nunca nessa vida.
Mas hoje teve uma coisa especial no natal: choveu muito. Não aquela chuva de verão que a gente tem visto nos últimos dias, mas uma tempestade mesmo, chuva de protesto. Contra as pessoas que param o trânsito na Paulista, contra quem resolve praticar boas ações SÓ no dia do natal, contra aquelas luzes todas que formam o circuito, contra todo mundo que comemora sem nem saber direito o que significa, sem nem se importar. Balde de água proveniente do céu em todos eles.
E eu, aqui, curtindo. Desde a hora que começou a chover, eu gostei muito disso. Abri a porta da sacada e a janela do meu quarto. Entrou água lá dentro e molhou a minha cama e as almofadas, mas eu nem liguei. A chuva me deixou muito feliz.
Então, dentro da idéia de não aderir a convenções sociais que não tenham sentido para mim, eu penso que vir até aqui, a esta altura, desejar feliz natal, seria, para se dizer o mínimo, incoerente.
Só que eu estou tão alegre que resolvi tentar. Acompanhem (e, por favor, se esforcem, se necessário for).
Choveu muito em Santa Catarina nos últimos tempos. Isto causou estragos, matou pessoas, deixou outras tantas doentes e desabrigou famílias inteiras. Esta é a mesma chuva que, todos os anos, em janeiro, causa em São Paulo enchentes cujas magnitudes são tão expressivas que chegam a ser noticiadas internacionalmente. Também é a mesma que faz falta no Nordeste, que faz com que a terra seja difícil de cultivar e que mata gente de sede e de fome por lá. Há muitos motivos para que não se goste de temporais como o de hoje.
Mas, só um pouquinho, só durante o tempo de leitura deste post, esquece disso. Deixa de lado os males que o excesso ou a falta de chuva podem causar. Pensa naquele vento geladinho que alivia o calor bizarro do verão, no barulho de carros deslizando na água, na vontade que dá de respirar bem fundo o ar úmido.
Lembra de como é divertido quando chove e você está de bom humor, seja jogando bola ou correndo para se molhar mesmo, como eu e a Má fazíamos na época de tardes no prédio do Bel.
Pensa também em como é gostoso quando você acorda no meio da noite, ouve o barulho da chuva lá fora e se aconchega fundo nas suas cobertas, se sentindo incrivelmente mais protegido do que estava antes.
Pensa em como é bom ter botas e guarda-chuva enquanto todo mundo se enganou com o sol matinal e saiu de casa totalmente despreparado.
Pensa, ainda, em como é gostoso ver um filme boboca quando o mundo está despencando, e na vontade que dá de tomar chocolate quente quando isto acontece.
Daí, partindo-se da premissa de que é natal mesmo, não dá para fugir... e, só um pouquinho... só durante o tempo de leitura deste post... se você se concentrou mesmo... talvez, agora, quando eu te desejar feliz natal, isso realmente faça algum sentido para você.
Feliz natal.

(A breguice vem com a época do ano, e eu nada pude fazer para evitá-la, inobstante todos os meus esforços)

22.12.08

por enquanto

Eu andei meio ausente daqui, e isso tem me incomodado um pouco. Mas eu tenho uma boa explicação: essa semana, lendo o livro do Cortázar que eu ganhei, eu vi que ele escreveu sobre um tema que eu já tinha postado, só que muito, infinitamente melhor do que eu.
E é a segunda vez que isso acontece, o que me deixou muito revoltada (a outra vez foi com o Ivan Lessa). Lógico que eu sei que eu não estou nem perto de sequer poder me comparar a nenhum dos dois - e isso não é falsa modéstia, lembrem-se que este é um blog que não respeita as convenções sociais desnecessárias - mas desincentiva, porque, poxa, eu tava dando tudo de si!
De todo modo, hoje eu estava aqui pensando e, a despeito de eu não gostar de usar este meio para falar de mim, não vou ter como escapar, já que decidi escrever, rasamente e sem nenhuma pretensão de esgotar o assunto, sobre amizade.
Na verdade, mais especificamente sobre a idéia do “melhor amigo”. Andei aqui refletindo que, ao longo destes 22 anos de minha existência na Terra, eu já chamei mais de uma pessoa de minha melhor amiga (amiga concordando com pessoa, ok?), mas acho que isso meio que contraria o próprio conceito tal como o concebemos, não?
Digo isso porque, quando eu era mais nova, eu tinha aquela ilusão ingênua de que eu ia encontrar uma pessoa que fosse uma espécie de minha cara-metade da amizade: que me escutasse, me entendesse, me apoiasse sem reservas, que dissesse o quanto eu sou legal e estou sempre certa, que me achasse linda e não visse defeito algum em mim.
Guess what? Noooot!
Ocorreu que, à medida que o tempo foi passando, eu percebi que, mesmo se o indivíduo acima descrito existisse, eu não ia querer estar perto dele, porque haveria de ser realmente muito chato.
Então, o meu conceito de melhor amigo mudou, com o quê eu me sinto verdadeiramente feliz, porque eu posso encaixar a maioria da gente não-família com quem eu convivo nele.
Finalmente eu estou num ponto da minha vida em que eu não preciso conviver com ninguém que me desagrade, já que eu deixei estas minhas amarras nalgum lugar no começo desse ano, e, francamente, ando melhor sem elas.
Voltando, acho que o amigo deve ser considerado “melhor” não pelo que ele faz por mim, mas pelo que ele é, no sentido de “mais bom”, ou melhor do que eu, detentor de qualidades que faltam em mim, mas que são indispensáveis para o muuundo.
Não vos enganeis. Nenhum amigo meu é super bom samaritano, mas cada um tem em si algo que me falta, alguma(s) característica(s) em que se destaca.
E, se teve uma coisa boa de ter ficado mais velha (não teve, mas atitude positiva é tudo nessa vida) foi que eu consegui enxergar que estas qualidades não tornam as pessoas perfeitas, mas sim seres humanos cuja convivência me é quase que vital, por quem eu nutro profundos respeito, admiração e agradecimento.
Deve ser por isso que eu não estou com medo de ir para a Europa, porque as minhas relações também amadureceram desde a época em que eu tinha aquela idéia xarope de melhor amigo. Agora eu sei que posso passar dois meses fora, que quando eu voltar (ressalvadas as merdas que sempre podem acontecer no caminho), eles estarão aí.
Dentro ainda do mesmo assunto, correndo o risco plenamente aceitável que a idade me permite, tem o aspecto da duração da melhor amizade. Outro dia eu estava fazendo chantagem com a Camila, porque eu queria que ela viesse com o pai dela me dar carona até em casa, e ela estava com preguiça. Daí eu perguntei: “mas Mimi... e o amor?”, a que ela prontamente respondeu: “o amor... está para sempre guardado no coração”.
Isto me levou a pensar a respeito da história do para sempre. Creio poder afirmar com alguma certeza que eu deixei bem clara a minha resistência à eternidade alguns posts atrás.
Só que hoje me veio na cabeça, ainda como um pensamento bem imaturo, que pode ser que o Renato Russo tenha se enganado ao afirmar que “o pra sempre sempre acaba”.
Começou dia desses, com a Má me falando que, quando ouvia a música que nomeia o post, sempre pensava em mim (e a recíproca é verdadeira). A causa imediata disto é o fato de ela ter me dado uma camiseta uma vez que tem estampada a frase “quando penso em alguém, só penso em você”, e a causa mediata, obviamente, são anos de história.
E a nossa convivência intensiva dos últimos dias, aliada a mil outros fatores, como o retorno de outros amigos para a minha vida e a surpreendente capacidade de me manter perto de quem está muito longe, verificada nos últimos meses, me fez entender que não é que o para sempre acaba.
É que, às vezes, as pessoas se afastam, te deixando com a nítida sensação de que acabou. Mas se pá tem uns “para sempres” que - ainda bem - são para sempre mesmo. Eles só estão te enganandinho, querendo te passar a perna.
Pobre Renato Russo, não viveu tempo o suficiente para ver isso, ou não tinha os amigos que eu tenho.
Ah, estava quase esquecendo... do ponto de vista deste blog, convém mencionar, meus amigos são absolutamente indispensáveis. Eles me inspiram (ok, não é grande coisa, mas é tudo o que eu tenho para oferecer).
Tenho também que dizer que o Renato Russo não errou em tudo na música. Ele está certo quando diz que “estamos indo de volta para casa”. Nos últimos tempos, eu tenho sentido com muita intensidade que meus amigos são a minha casa que eu escolhi.
Assim, vou levar uma junto para dividir comigo a árdua tarefa de me aturar durante a viagem, mas deixo os outros amigos aqui, guardados para sempre no coração, porque, afinal, minha afilhada sabe das coisas.

14.12.08

wish you were here

Escutei essa música do Pink Floyd ontem de madrugada e ela me fez refletir. Acho que a maior crítica que nela está inserida sutilmente, entre solos de guitarra e muito boa melodia, diz respeito ao fato de que existem pessoas que, hipocritamente, acham que sabem o que é melhor para as demais, mas estão enganadas. O mais triste da história é que eu acho que me incluo nesta categoria, por mais que doa admitir.
Vou dar um exemplo complicado, mas que eu creio que explica bem a situação. Outro dia, a Carol contabilizou 32 mendigos dormindo na frente da faculdade, de um dos lados do portão principal. 32!
Aquilo nos revoltou, e passamos algum tempo conversando sobre como aquela miséria humana ali, escancarada nas nossas vistas, nos incomodava, o que poderia ser feito para que se operasse alguma mudança.
Também, o fato de aqueles mendigos estarem lá e de eu me indignar tanto me fez lembrar daquele filme “eu sou a lenda”, do Will Smith. O filme tem boas cenas e boas sacadas, mas no geral eu achei meio ruim, porque eu não gosto de filmes de zumbis.
Depois de meses que eu já tinha assistido no cinema, lançaram o DVD, acompanhado de um final alternativo para a história.
No roteiro que foi às telas, Will Smith, após descobrir a cura para a mutação genética que transforma seres humanos saudáveis em humanóides primitivos dotados apenas dos seus instintos básicos, diz para a Alice Braga qual é a solução e se mata para que ela e o menino que ela carrega consigo como se dela fosse possam sobreviver e espalhar a boa nova.
Neste outro final, ele percebe que, na verdade, todo o empenho incessante que ele tinha despendido para achar uma cura para aquele mal refletia uma preocupação só dele, não dos zumbis. Do ponto de vista destes, Will Smith era o diferente, ele era “o monstro”, eles não queriam ser curados.
Não vou nem tentar me justificar por ter comparado zumbis a mendigos, porque eu sempre fui meio politicamente incorreta mesmo.
Porém, o ponto é: sabendo-se que, estatisticamente, está comprovado que boa parte dos moradores de rua sofrem de doenças como esquizofrenia ou alcoolismo, que alguns têm casa, família e tinham empregos, até que ponto não serei eu o Will Smith ignorante por querer tirá-los desta realidade, à qual, bem ou mal, eles estão adaptados?
Óbvio que eu não estou querendo dizer que aquilo é legal, que eles gostam de morar na rua, serem maltradados, não terem as mínimas condições de higiene, não saberem quando ou se vão comer de novo. Mas a verdade é que eu vi esta situação a partir da minha perspectiva de jovem branca da classe média e, para mim, submeter-me a estas condições seria inaceitável. Para eles, claramente, não é.
Então me parece que simplesmente mandá-los para um abrigo da prefeitura, ou conversar com eles fazendo discursos do tipo “você não precisa estar nessa situação”, “vá arranjar um emprego”, “sua vida pode melhorar muito”, sem que eu tenha condições de efetivamente assegurar que estas promessas tenham a mínima possibilidade de se tornarem realidade, é só hipocrisia.
É uma solução paliativa, que só atende à minha própria necessidade. É “tell heaven from hell”, só que ao contrário (tell hell from heaven) pois eu não sei do que eles precisam, sei apenas de que remédio analgésico a minha consciência precisa: não vê-los (assim).
E eu tenho a impressão de que a crítica a esta hipocrisia prossegue na música, e na minha vida, na medida em que o cara questiona se a pessoa trocaria algumas coisas por outras, sabendo que ela não trocaria, da mesma forma que eu.
Outro exemplo: eu realmente acredito que ninguém merece viver na rua, sem ter onde tomar banho, comer, satisfazer suas necessidades fisiológicas, dormir, e exercer a sua intimidade. (É, também não entendi qual foi a de saírem tantos eufemismos.)
Só que, na real, se me dissessem que tem um jeito, qual seja, eu assumir o lugar de um deles, sendo que este escolhido passaria a levar uma existência digna, eu não iria. Porque eu não estou preparada para trocar “cold comfort for change”. E assim, eu me penitencio, porque acredito que se alguns não têm o mínimo, todos os demais deveriam se mobilizar de todas as formas para que eles tivessem, mas não estou pronta. Não para esta mudança, pelo menos.
No fim da música, ele fala que queria que a pessoa para quem ele canta estivesse com ele, a despeito de ter reconhecido nela o enorme defeito que eu apontei acima, e sabendo que eles dois não passam de almas perdidas nadando dentro de um aquário, de modo que não vão chegar a lugar algum.
Mesmo assim (ou justamente por isso, na interpretação da Má), ele repete: “wish you were here”, levando-nos à conclusão de que as pessoas precisam umas das outras porque precisam, independentemente dos defeitos que possam ter, apenas pelo conforto que a presença delas é capaz de trazer.
De qualquer forma obrigada, Pink Floyd, por me querer.

(ficou um pouco Legião Urbana demais... definitivamente, eu não devo escrever sobre problemas sociais, nem de Pink Floyd, mas... são 3h da manhã, e o que eu faço com essa vontade de gritar?)

9.12.08

eu tenho medo do infinito

Não sei exatamente quão covarde a pessoa se torna ao admitir uma coisa dessas, mas fato é que eu tenho medo do infinito.
Percebi isso semana passada, quando eu estava sobrecarregada com provas e problemas de toda ordem me assombrando. Numa tarde, depois de sair do escritório mais cedo para estudar para o dia seguinte, eu estava simplesmente tão desesperada que fiquei com vontade de entrar na catedral da Sé (que estava ali do lado) e pedir para alguém resolver tudo por mim.
Pensando a respeito deste meu surtinho, eu lembrei que existe um trecho de uma música em que o cara descreve a situação em que ele se encontra - desesperado, na chuva, que depois vira enchente - como um “accident of faith and nature”.
Ora, é fácil entender porque uma chuva destruidora, que arrase casas, plantações, pessoas, estradas e tudo o que vê pela frente, seja considerada um acidente da natureza.
Agora, para ser sincera, eu não tinha entendido o conceito de acidente da fé até me acontecer de eu querer entrar na igreja nesse dia aí que eu falei. Explico. Acho que todo mundo já passou por uma situação em que está tudo tão complicado que, mesmo não acreditando em Deus, ou em destino, ou na sorte, tudo o que se quer é que uma oração resolva.
Só que eu não entrei aquele dia, porque eu não acredito que exista alguém que possa resolver os problemas que eu criei, ou aqueles nos quais eu me meti, ou que vá gritar bem alto de cima de uma nuvem - de modo a que eu possa ouvir - as respostas da minha prova de direito tributário. Foi só um acidente, um ato falho, causado pelo meu desespero, pensar que as soluções poderiam vir fáceis assim.
É como a história do choro, n’A Cidade dos Anjos. Eu nem gosto desse filme (pronto, falei!), mas acho boa a idéia. Segundo o Nicholas Cage, a gente chora quando uma emoção que se sente não cabe no corpo, e esse é o nosso meio de extravasar, colocar para fora.
Foi assim com aqueles meus problemas. Se Deus existisse e fosse esse grande assistente social que muita gente espera, eu teria dado tudo o que me perturbava para ele resolver naquele momento.
Dentro desta linha, eu comecei a pensar que, obviamente, Deus não está aí para resolver as confusões em que a gente se mete, simplesmente porque, se fosse possível fazer com que Ele lidasse com isso ao invés de nós, o engenho humano já teria dado um jeito de operacionalizar a transmissão.
Depois, eu pensei que tem aquela história da vida eterna. A gente se ferra um pouco por aqui, mas, morrendo, a alma vai para o paraíso ou para o inferno, “viver” eternamente.
Talvez (a primeira conclusão a que chegará o caro leitor) eu tenha medo do infinito porque é mais provável que eu arda em chamas do que que eu desfrute da paz eterna ao lado do Senhor.
Porém, eu, aqui, na minha infinita arrogância, acho que não é só por isso não. Tem mais.
Isso de “para sempre” há de ser muito chato. Para que fosse divertido, dependeria da existência de infinitas formas de diversão, o que eu não sei se é possível. E da ausência de cansaço, fome, sono. Também não poderia haver suor nem quinas onde a gente batesse dedinhos ou canelas, porque esse é o tipo de coisa capaz de arruinar tudo, principalmente quando o tempo não conta.
Então eu cheguei à conclusão de que eu prefiro lidar com a minha própria finitude. Afinal, se pá esta vida contém espaço e tempo suficientes para eu plantar minhas idéias, cuidar dos meus amigos (no meu caso, ser cuidada por eles), abraçar o que for fofo, rir do que for engraçado, chorar bobamente, enfim... fazer tudo o que eu achar que preciso.
E, se eu estiver certa, então para que eu preciso de uma vida eterna? Para lembrar ou para ter mais do mesmo? Porque qualquer destas opções me desagrada, muitíssimo.
E acho que é por isso que eu não acredito em Deus. As propostas dEle são fracas para mim. Eu tenho um problema com a eternidade.

3.12.08

do porquê eu gosto de porcos

Outro dia, eu ouvi, um pouco em tom de crítica, que este blog às vezes é escrito em juridiquês. Acho que isso se justifica, porque eu faço direito e isso representa boa parte da minha vida e de quem eu sou.
Por isso, nada obstante a observação, resolvi trazer um conceito de Introdução ao Estudo do Direito lá do primeiro ano para explicar a história dos porcos.
Segundo o Tercio, o homem é “um feixe de papéis sociais”. Cada um de nós é, ao mesmo tempo, irmão, filho, sobrinho, neto, amigo, aluno, colega, e tantas outras posições sociais, em relação aos outros.
Óbvio que não dá para ser todas elas ao mesmo tempo, do ponto de vista de uma mesma pessoa. Então, segundo o Tercio, a soma destas posições sociais é o que te define. (Posso estar falando bobagem. Se eu estiver, não me corrijam porque eu preciso dessa premissa para firmar o meu ponto.)
E eu concordo com ele, em certa medida. A maioria das relações que a gente desenvolve em sociedade leva em conta somente um determinado aspecto da personalidade do outro.
Por exemplo, outro dia rolou um boato de que o Del Nero, nosso professor de direito civil, é alcoólatra, junkie, que ele sai dos bares carregado, que envergonha os filhos e tal. Além de altamente improvável, tendo em vista que o cara é a própria imagem do bonus paterfamilias, isso não me diz respeito, nem me interessa, absolutamente.
Para mim não importa se ele é alcoólatra, cocainômalo, ninfomaníaco. Ele é meu professor, e, como tal, ele é bom, apesar de sugar todas as minhas energias com as suas aulas intermináveis, que eu meio que parei de assistir. Se eu começasse a me relacionar com ele em outros níveis, sendo, digamos, amiga dele, eu teria que me preocupar com as bebedeiras. Mas eu não quero, e não preciso.
Ou então, tem uma menina na sala que tem nome de anjo e se veste muito mal. Gente, muito mal mesmo. Só que ela é só minha colega de classe e eu nem falo com ela. Se ela passasse a ser minha amiga, eu ia ter que parar para pensar se dava uma dicas para ela ou se não me importaria em ser vista ao seu lado. Do jeito que as coisas estão, porém, nada disso faz diferença.
O que eu estou querendo dizer é que é bom, quiçá ótimo, que seja assim. Até porque, nestes 22 anos, foram poucas as pessoas que eu me dei ao trabalho de conhecer a fundo, além dos papéis sociais que elas desempenhavam.
E, tirando aquelas cuja permanência não é opcional (tipo a minha mãe), a tendência tem sido elas saírem da minha vida depois disso. As que ficaram, foi na base de não pouca pancadaria. Muito amor, mas porrada também.
Não quero com isso defender o terrível ditado popular de que “a ignorância é uma bênção”, porque eu realmente não acho isso. Tenho para mim que, se a intenção for reduzir o problema a uma frase feita, a que mais se aplica é “a intimidade é uma merda”.
Agora, a mesma idéia serve para o problema dos porcos, tema deste post. Quem me conhece, já veio na minha casa, já passou pelo escritório ou já me viu mexendo na minha bolsa, sabe que eu adoro porquinhos.
E, em geral, quando eu falo disso, as pessoas perguntam: “mas por que porcos? Você sabe que eles fedem, né?”
Sim, eu sei que eles fedem, que eles chafurdam na lama - que muitas vezes contém resíduos dos seus próprios excretas -, que eles comem qualquer coisa (e imaginem o que não é “qualquer coisa” depois de todo o processo digestivo - e eles chafurdam nisso), que eles ficam do tamanho de monstros e daí não tem quem segure.
Eu sei. Mas não faz diferença, porque os meus são bonitinhos, fofinhos e quando eu os vejo ou os abraço, me dá uma sensação de paz e alegria interior que só eles trazem.
Bom, mas daí haverá quem novamente questione a escolha por porcos, já que ursos-ursos, ursos pandas, hipopótamos e vacas também são animais que, na vida real, não têm glamour algum e, quando são transformados em pelúcias ficam txutxucos.
Daí, a única explicação que eu tenho para dar é que os meus porquinhos são rosas.

29.11.08

a minha decoração de natal

Uma das pouquíssimas coisas de que eu gosto a respeito do natal é o fato de que todo ano, infalivelmente, minha avó enfeita a casa dela inteirinha. Então, quando eu chego para a ceia, está lá tudo bonito e arrumadinho, e boa parte da graça vinha justamente de estar tudo pronto e eu não ter visto o processo. Isso tinha lá a sua magia.
Semana passada eu fui visitá-la. Minha tia que mora com ela viajou no dia em que eu cheguei, e a Giulia e a Beatriz, minhas priminhas, vieram ficar com a gente depois da escola.
Lá pelas tantas, minha avó decidiu que seria a hora de começar a montar a decoração de natal. Foi lá na despensa e voltou com uma caixa e 17 sacolas, aproximadamente.
Eu estava indo para o quarto com as meninas porque, afinal, aquilo era assunto dela, mas ela não deixou. Resolveu me pedir ajuda.
Como eu não sou a pessoa que nega pedidos à própria avó, eu comecei a empurrar móveis, desencaixotar a árvore de natal, pendurar guirlandas, bolinhas e bonecos. E aquilo me deixou triste, porque tudo o que eu estava fazendo tinha que ter sido feito pela mão invisível do papai noel que conduz o natal em São José (à la Adam Smith).
Para minha imensa surpresa, as meninas estavam se divertindo muito com tudo aquilo. Elas gostaram de pendurar cacarecos na árvore e de me ver com medo de cair do banquinho capenga que me foi disponibilizado para pendurar o papai noel pára-quedista no lustre da sala.
Do ponto de vista delas, a diversão não era encontrar tudo pronto, era fazer. E isso me deixou meio perplexa, porque para mim sempre foi reconfortante ver que a minha avó tinha despendido tempo e carinho para fazer a casa ficar bonita para mim, os filhos, os outros netos e os agregados, porque sempre os há.
Mas Giulia e Beatriz não precisam disso. Acho que as crianças de hoje são mais fortes. Ou simplesmente não têm as mesmas ilusões que eu tinha, porque eu de fato tinha lá as coisas faziam o meu natal ser "mágico" e divertido. E essa era uma delas.
E pensar nisso me fez perceber que o natal é uma grande mentira. Se eu quisesse parecer melhor do que eu sou, eu diria que é por isso que eu não gosto dele, mas até não é. Não gosto porque acho triste e implico. Implico mesmo.
Talvez, por ter essa picuinha, eu tenha exagerado, confesso. “Grande mentira” é forte demais. O natal está mais para uma mentirinha branca, daquelas que a gente ouve, acredita ou não, mas repete, passando adiante, porque sabe que não vai fazer mal algum a ninguém.
Às vezes acho que a gente simplesmente precisa de uma mentirinha branca.
Tem situações em que a realidade é difícil demais de encarar, então a gente inventa uma explicação alternativa, como é o caso de quando alguém que a gente gosta morre.
Ou então você passou o ano inteiro trabalhando, longe de todo mundo, correndo para lá e para cá, e precisa tirar uns dias para encontrar a família ou só relaxar. Daí entra o natal. Lógico, vem encapado de celebração do nascimento de Jesus e tal, mas é feriado mesmo para quem não acredita nEle, o que só evidencia mais o seu caráter de inverdade da espécie alva.
A maior vantagem dessas mentirinhas brancas é que elas são muito convenientes. Adoro ter legitimidade para passar a tarde assistindo filmes velhos da programação bizarra de fim de ano porque é natal.
É a mesma coisa com a história do céu. Tiram de você alguém que você ama, mas te dão em troca a esperança de poder reencontrá-la um dia. Não dá para negar que é um conforto pensar que eu vou reencontrar o vô Celso e o Di, um dia; esses pensamentos tornam a realidade bem mais suportável.
Como se não bastasse, dizem por aí que o reencontro se dará num lugar melhor, onde a gente não vai ter que se preocupar com trabalho, nem com dinheiro, nem em perder tempo longe do que importa, nem com a segurança, nem com nada. Pô, animal.
Mas a verdade é que só reencontrá-los já bastava.

(caso não tenha dado para perceber o espírito, esta é a decoração de natal deste blog.)

26.11.08

no meio do caminho

Outro dia, conversando com um amigo no MSN, eu percebi que eu estou sempre no meio do caminho. Estou entre ser boa aluna e largar isso de vez (porque o desprendimento de não ver aula eu já tenho, mas ainda me sinto obrigada a estudar mais do que é saudável para as provas), entre a iniciativa privada e o Ministério Público, entre ser boa amiga ou boa neta, e no meio de alguns outros caminhos sobre os quais eu sequer me atrevo a escrever.
Fosse este post um livro de auto-ajuda, eu diria que eu estou numa “fase de transição” - a galera da auto-ajuda é muito boa em arranjar nomes eufemísticos para quando você tá na roça.
Fosse isto um livro de teoria geral do Estado escrito pelo Tojal, minha situação atual se chamaria “crise dos paradigmas”.
Por esta lógica, fosse este humilde texto um livro de auto-ajuda-jurídica, seria uma “crise - do tipo ‘de crescimento’ - dos meus paradigmas”.
Não é, é antes um post-justificativa do porquê eu ando escrevendo pouco, e a culpa é das provas. O resto eu vou resolver, mas depois que elas passarem.
Agora, como eu já não estou estudando mesmo, vou aproveitar para compartilhar os meus pensamentos de, 2ª feira, quando eu estava indo para o escritório, debaixo de super chuva.
Eu tenho a impressão de que dias chuvosos me fazem pensar mais do que dias ensolarados, nem que seja só algo simples do tipo “ai, ainda bem que eu estou em casa”.
Na 2ª feira, eu não pude ficar debaixo do cobertor quentinho porque tive que ir trabalhar. Calcei as minhas botas, peguei meu guarda-chuva e fui.
Pensei que era bom ter botas naquele dia em que chovia torrencialmente, e que se eu não as tivesse calçado, eu certamente teria molhado os pés e passado o resto da tarde de mau-humor.
Achei que tinha sido uma boa idéia pegar a sombrinha, mesmo meio quebrada, ao invés de vestir a capa, porque eu não ia ter onde pendurá-la e ela ia ficar cheirando a mofo e eu ia ter nojo de vesti-la de novo depois.
Aí eu entrei no metrô, e sentei. Na estação seguinte à minha entrou uma mulher que me fez vivenciar a cena mais ridícula dos últimos tempos.
Convém observar que a idéia original não era parafrasear Drummond, mas parece que ele roubou essa frase para ele e agora quando alguém diz tem que citá-lo. Tudo bem, eu gosto dele.
Então, estava eu, indo para o escritório... e, no meio do caminho, tinha uma GORDA. E tinha uma gorda no meio do caminho.
Branca de pele, morena de cabelo, estatura mediana, indíce de massa corporal muito acima do recomendado pela OMS, vestindo uma bata larguinha. Manja aquelas mulheres “fortes”? Ela!
Parou na minha frente, com uma postura toda digna. Toda pomposa e cheia de si. Olhou para mim como se eu fosse um verme. Calmamente, abriu uma revista “Crescer” e começou a folhear.
Recapitulando, o quadro era o seguinte: estava eu sentada no banco marrom (jamais sentar nos bancos cinza-reservado do metrô), com uma mulher parada na minha frente, cuja linguagem corporal dizia claramente “você está no meu lugar”.
Só que esta distinta cidadã era gordíssima. E, a que eu saiba, o sobrepeso ainda não dá àqueles que o ostentam o direito de pleitearem lhes seja cedido o assento.
Daí a vadia abre uma revista de nenê, vários nenezinhos bonitinhos na revista inteira, e começa a folhear. Só pode ser palhaçada!
Não tinha, juro, não tinha como saber se ela estava grávida! A não ser pela atitude altamente sacana da revista, então eu não levantei. Pode ser que ela estivesse, porque ninguém sai por aí folheando revistas de nenê, não é lá que estão as melhores reportagens. Mas, e se ela não estivesse e eu levantasse para ela sentar?
Ridículo, a gorda me meteu na maior situação ridícula.
E as minhas retinas tão fatigadas nunca se esqueceram...

20.11.08

sobre as escolhas fáceis

Hoje eu li uma reportagem sobre como as fêmeas de macaco se comunicam até 13 vezes mais entre si do que os machos. Na hora que eu vi a manchete, eu pensei em tiozões que se acham engraçadões dizendo “tá vendo? Até as macacas são fofoqueiras... é do gênero feminino!” (ok, eles jamais diriam nestes termos, mas eu precisava sintetizar a idéia)
Na verdade, elas se comunicam mais para estabelecer estruturas sociais mais sólidas, que viabilizam a convivência em grupos como os que os macacos formam, mesmo porque os machos tendem a mudar de bando, enquanto as fêmeas sempre ficam no mesmo, sendo responsáveis pela criação dos descendentes.
O que isso me fez pensar é que, às vezes, as pessoas simplesmente encontram soluções mais fáceis para determinadas situações que se apresentam, ao invés de investir algum tempo e dedicação na busca de melhores ou mais adequadas respostas (no caso: mulheres são fêmeas/macacas são fêmeas. Mulheres são fofoqueiras. Logo, macacas fêmeas são fofoqueiras).
Por exemplo, outro dia eu estava conversando com a Carol sobre uma novela que passou há vários anos e que a gente assistia. Era uma novela das oito e, portanto, tinha que conter certas cenas de sexo, ou, pelo menos, de insinuação de sexo. O que fez o autor então? Inseriu ali uma personagem ninfomaníaca! Vejam só... assim ele não teria que se preocupar em ficar inventando situações esdrúxulas em que o mocinho encontra a mocinha caminhando na praia e o amor fulmina, o desejo arde e eles transam. Não! Cada vez que a audiência começasse a cair, a mulher tinha um surto e dava loucamente para o marido. Simples assim.
De outro lado, naquele romance Ramsés, o faraó que dá nome ao livro é completamente apaixonado pela sua esposa, Nefertari. Mas também, pudera. A mulher é maravilhosa, simplesmente irresistível, e o amor dos dois é perfeito, porque é impossível não amá-la, e ele se rende aos infinitos encantos dela. Assim, poderia o autor ter escrito sobre uma relação de conveniência, jogos de poder, e de convivência difícil de um homem com o maior ego do mundo (o cara era um deus vivo) com uma mulher provavelmente muito vazia e superficial, que acordava mal arrumada e só se interessava por riqueza? Poderia, mas não escreveu.
Por fim (né?), o Rei Leão. Eu não queria ter que falar mal dele não, mas assim... a Disney fazer um filhote de leão entrar numa crise existencial, por mais profunda que seja, é quase uma palhaçada. Porque, em se tratando de Disney, é óbvio que o bicho estaria fadado a superar quaisquer conflitos interiores que o afligissem. E quando ele se encontra, o que ele é? Uma cigarra? Um porco-espinho? Um peixe bioluminescente? Não! Ele é um leão, o rei dos animais. Quer mais fácil que isso? Queria ver uma tênia se descobrindo enquanto tênia e ainda assim sendo feliz...
Pensei bastante em qual seria a explicação para essas escolhas fáceis que alguns autores (em maior número do que eu gostaria) fazem. A única que eu consegui foi: porque eles escrevem por obrigação, têm prazos a cumprir e têm que agradar (e, no fim, até sabem agradar).
Só que essa minha resposta é simplória, e acaba caindo exatamente no erro que eu venho condenando neste post inteiro, já que todo mundo que escreve, escreve por obrigação.
Não obrigação no sentido legal do termo, de uma prestação devida. Obrigação no sentido mais lato que pode ter, ou seja, porque não tem opção.
Lógico, eu poderia sair para correr, se a idéia fosse liberar a mente desses pensamentos, jogar meu celular no chão, se o intuito fosse liberar a raiva, ou chorar até secar, para aliviar eventual tristeza.
Mas não basta. Nada disso basta.
Então eu escrevo.

13.11.08

Alguém segura essas sinapses!

Final do expediente, fui ao fórum fazer um protocolo. Eu sempre vou no Hely Lopes, porque o fórum central é muito cheio. Cheguei lá às dez pras sete, e tinha uma filinha de funcionários do lugar esperando para passar o crachá de ponto na máquina tão logo o relógio marcasse a hora cheia.
Olhei para aquela galera e eu vi que eles estavam super se achando os malandros porque iam sair às 7 em ponto. A verdade é que eu também estava, porque como é que ninguém descobriu o Hely Lopes até hoje? Todo mundo vai no fórum central e as filas lá são gigantes!
De qualquer forma, eu fiquei na frente do guichê que recebe as petições refletindo que tem muitos animais malandros nesta natureza. O gato, que já nasce de bigode, o pato, que nasce com os dedos grudados para não usar aliança e o sapo, que não tem bunda e senta.
Mas espera... tem uma música que fala “que vida boa, ooo, que vida boa... sapo caiu na lagoa”. Se o sapo cai na lagoa, que é o habitat natural dele, então ele não é lá tão sagaz assim!
Porque, acompanhem, o sapo deveria dominar a lagoa, deveria coaxar na lagoa, deveria pular de vitória-régia em vitória-régia na lagoa, mas não cair nela!
Cair na lagoa não é malandragem alguma! E, dito isso, tendo eu provado o meu ponto sem deixar qualquer margem para argumentação em contrário, com quem eu falo para tirar o sapo do rol dos bichos malandros?
De outro lado, assim, apenas por amor ao argumento, admitamos que o sapo caia na lagoa sem que ele seja o maior loser... Como isso pode fazer a vida de alguém ficar tão boa a ponto dela se dignar a compor uma canção a respeito?
Superado este ponto, eu lembrei que esta música é sertaneja. Até há umas duas semanas, todo mundo a conhecia, menos eu. Isto me fez voltar à pergunta que eu tenho me feito recorrentemente nos últimos tempos: quando foi que sertanejo virou hype?
Ok, vamos por partes nesta busca incessante por resposta para este questionamento relevantíssimo. O Neto conhece, mas ele é do interior. A Carol também, mas ela assiste novela. Os amigos da Lê todos curtem, mas eles fazem medicina e, conclusão lógica, têm um parafuso a menos. Meu irmão gosta, mas acho que ele não conta, porque a vida toda ele foi conhecido em casa como “Daniel, o bregóide”.
E daí eu vi que ser paulistana, estudante de direito, pretensamente ocupada e da zona sul pode realmente te isolar de todas as novidades artísticas e tendências musicais do momento.
Mentira. E não, eu não vou por aqui, que eu não quero me arriscar a ser chamada de emo de novo.
Para concluir, acho conveniente que analisemos alguns possíveis fatores que contribuem para o sucesso:
(i) as letras são fáceis
(ii) os caras são dois - duplas sertanejas são sempre duas pessoas... e daí se você não gosta de um, muito provavelmente vai gostar do outro... ou não, mas aumenta muito as chances
(iii) alguns até são gordos, o que sempre favorece a empatia
(iv) eles acham que a vida é boa porque os batráquios tombam para dentro de lagos, ou, por outras palavras, “eles vêem a felicidade nas pequenas coisas”.
Em suma, what’s not to like?
É, Gabi, definitivamente, você anda sendo muito crítica...
E vejam, este era para ser um post sobre o quanto o comodismo dos funcionários públicos me irrita. Mas não, eu não vou mais escrever sobre isso. Ao contrário, vou deixar registrado aqui o meu protesto, sem nem prometer tentar reverter o quadro se/quando eu estiver do lado de lá da Força. Porque, afinal, a gente não liga para promessas.

11.11.08

Contra o imediatismo cego

Ontem eu amanheci doentona. Assim, ferrada mesmo. Dor por tudo que não queria saber de passar, e nenhuma disposição para fazer nada nessa vida.
Sim, eu já estou melhor, obrigada. Mas sei que não preciso ficar dizendo que esta experiência me fez refletir pacas e pensar em mil coisas legais que eu poderia escrever aqui, porque não é verdade.
Eu passei bastante tempo em casa nestes últimos dias, e li muito, porém nem por isso eu tive qualquer grande inspiração. Desde ontem, nada me tocou, nada me abalou, nada me deu vontade de escrever. E eu nem acho que isso seja ruim.
Daí agora eu estava aqui sentada de bobeira, e me veio uma letra de música do Snow Patrol à cabeça. Não, nem sempre elas contêm em si uma luz no fim do túnel, e essa diz “life is way too short to scream and shout”.
Isso me deixou um pouco irritada. Esse é o tipo de frase que você espera ouvir em bom baianês nas músicas dos Inimigos da HP ou da Banda Eva. Nenhum problema com eles, todo mundo os ouve, tanto que eu sequer vou me dar ao trabalho de negar.
O problema com esse gênero de música é que às vezes eles saem da temática sobre a alegria da capital baiana e como a vida pode ser boa durante as festividades carnavalescas para tentar se imiscuir nas questões do amor e seus correlatos da auto-ajuda e do aconselhamento. E daí eles falham feio.
Porque é simplesmente impossível a pessoa se contentar com a pouquíssima complexidade de músicas que reduzem todo o sentimento às sensações compartilhadas durante o sexo (ou antes ou depois), por mais fácil que seja confundir tesão com amor. E assim, é muito mais fácil do que eu gostaria que fosse. Então, sexo é legal pacas e tudo, mas não é amor, ainda que partes de mim desejassem que de fato fosse simples assim.
Voltando ao problema da simplicidade, estamos acostumados a ouvir chavões como “hoje eu só quero é beijar, beijar”, “é dia de festa” e vários outros, pregando a filosofia de aproveitar o dia loucamente, sem levar mais nada em consideração.
Não vou entrar no mérito do porquê destas músicas tratarem disto, com tanta freqüência e fazendo tanto sucesso, pois eu sei que não conseguiria fazê-lo sem soar preconceituosa. Estou querendo evitar.
Mas confesso que fiquei chocada quando ouvi o Snow Patrol - aquela banda inglesa que tem músicas lindas - pregando a mesmíssima coisa.
Assim, essa coisa do carpe diem nunca me convenceu, e isso de ter que viver cada dia como se fosse o último, pelamordedeus! Que pressão absurda!
Pelos idos de 1999, anunciaram que uma profecia do Nostradamus dava conta de que um asteróide cairia sobre a Terra no dia XI.8 (ehe) daquele ano, acabando com a vida como a conhecemos. Na época, eu me lembro que rolou uma grande pesquisa a respeito do que as pessoas fariam nos últimos dias de vida e tal.
E, como sói acontecer, teve todo tipo de resposta, desde quem torraria loucamente todo o dinheiro até quem se retiraria num acampamento holístico.
A conclusão a que eu cheguei, já naquela ocasião, foi a de que, se o mundo for de fato acabar, ninguém pode saber. Caso contrário, todos seríamos confrontados com uma situação de caos absoluto (porque eu é que não ia ficar escrevendo petição no último dia da minha vida enquanto você, caríssimo leitor, estivesse na praia) antes mesmo da grande destruição. Da mesma forma, não seria exigível fazer frentistas trabalharem, nem professores, nem prostitutas, porque afinal seria o último dia deles também.
A mesma idéia se aplica para a tão apregoada filosofia de viver cada dia como se fosse o último. Se todos a adotassem, não haveria meios de se conviver em sociedade. Então torçamos para que tudo não passe de rimas.
E sobre a minha indignação com o Snow Patrol, eu resolvi analisar melhor a letra da música, e verifiquei que, no caso deles, o sujeito está de fato na iminência da morte. Então tudo bem. Ufa!
A última observação que eu tenho a fazer é a de que, por mais bonita que possa parecer a idéia de levar a vida como se não houvesse amanhã, ela tem duas falhas: 1. E se aquilo que você anda esperando que aconteça estiver programado para depois de amanhã. E aí? 2. A chance de seu(s) último(s) dia(s) ser(em) como o meu de ontem - de cama, com dor - é muito maior do que a de ser(em) dia(s) ensolarado(s) da aurora da sua vida.
Portanto, carpe diem.

9.11.08

Pra não dizer que não falei de Obama

Desde 3ª feira passada, acho, quando foi anunciada a vitória do Obama na disputa pela presidência dos Estados Unidos, todo mundo só fala disso.
E eu, na minha incessante tentativa de me integrar à grande massa disforme a que se convencionou chamar de “todo mundo”, achei que seria de bom tom escrever sobre isso também.
Então é nóis. Li um artigo esses dias que tratava do seguinte: por baixo da pele, somos todos iguais. O próprio repórter falava que sabia que isso não era novidade para ninguém, mas que achou importante relembrar, já que, embora a vitória do cara tenha lá a sua importância do ponto de vista da superação do racismo, geneticamente falando, era tudo potêitous potátous o fato dele ser negro.
De todo modo, essa coisa de sermos todos iguais por baixo da pele me fez pensar. Então a gorda fumante (que fuma o cigarro mais incrivelmente fedido de todo o universo sempre na arcada ao lado da nossa), todas as piriguetes que vão pro baile sem calcinha, os corinthianos e o Obama, gente... por baixo da pele todo mundo é igual a mim! Medo! E depois que eu estiver bem mortinha, ninguém vai nem conseguir diferenciar se era eu ou eles... desaforo!
Assim, por favor compreendam que ser igual à gorda fumante não tem como ser bom e eu precisava expressar a minha revolta. Feito isso, foco!
Daí uma galera emitiu mensagens de congratulações. E quando eu digo “galera”, eu quero dizer galera mesmo. Para citar alguns: Lula, Angela Merkel, Gordon Brown, Chavez, Zapatero, Sarkozy. Agora todo mundo é best friend forever do Obama e o apoiou desde o início. Sei.
Teve ainda outras manifestações, tipo a revoada de balões na faculdade Zumbi dos Palmares e a decretação de feriado nacional no Quênia.
Pessoal, pega na mão da tia... não é para vocês que ele vai governar. Ainda bem, porque homem nenhum resistiria sem ser corrompido com tanto poder nas mãos.
E tem mais, é tudo muito bonito e muito empolgante, mas acho que a gente não deve esquecer que ele ganhou por muito pouco. Pouquíssimo. No voto popular, ele teve 52% contra 47% dos votos para o McCain (eu sei que essa conta não fecha, mas eu tenho certeza que foram esses os números que li!).
Desta forma, não fosse o McCain ter jogado contra si próprio, nada disso estaria acontecendo, a vitória foi apertadíssima.
Agora, o que eu achei mais interessante foram as reações dos prefeitos de São Paulo e do Rio de Janeiro. Kassab mandou uma mensagem para o Obama, cujo destino mais provável foi o chamado arquivo L, ou lixo mesmo.
Mas o Paes ganha. Ele divulgou uma nota! O cara divulgou uma nota parabenizando o Obama, mano! Nem prefeito ele é ainda, e ele achou que seria pertinente divulgar uma nota! Convenhamos que faz todo o sentido, já que eu ouvi dizer que o Obama checa os jornais de grande circulação do Rio de Janeiro todas as manhãs antes de deliberar sobre os assuntos dos Estados Unidos. (ironia)
Ora, faça-me o favor! Depois o povo pergunta porque que eu não gosto de carioca! Além de eles terem aquele sotaque odioso, eles ainda me vêm com essa!

6.11.08

Curto, porém pretensamente profundíssimo

Tive uma epifania hoje que achei digna de ser compartilhada: só escreve quem é triste.
Antes, porém, de desenvolver a idéia, tenho que fazer uma observação. Uma das coisas de que eu mais me orgulho de pensar é que um conceito - que pode ser tido pela sociedade toda como uma verdade - só passa a ser seguido por mim a partir do momento em que eu o compreendo pelos meus próprios meios.
Então assim... eu já entendi alguns axiomas, mas outros, que permanecem carentes de comprovação, para mim não são verdades absolutas.
Por exemplo, já entendi que beber demais é ruim, depois do porre master, e que a religião pode ser boa para algumas pessoas, embora eu ainda não tenha conseguido compreender a necessidade dela na minha vida especificamente. De outro lado, ainda não saquei porque tem tanta gente que acha que homossexualismo é imoral e, para ser sincera, estou intuitivamente do lado daqueles que querem derrubar essa concepção.
Pois bem. A epifania. Estava eu hoje entrando no metrô meio tristonha porque a faculdade anda me oprimindo com handouts de civil para entregar cedo e a proximidade do fim, quando me veio um trecho de música à cabeça, daquelas músicas bobas que a gente cantarola do nada, sem nem saber porquê, e de repente ele fez todo o sentido. Um sentido que eu nem achava que ele tinha.
Foi aí que eu percebi que, de fato, a gente só escreve quando está triste. (Não sei se isso é verdade absoluta ou não, mas achei melhor me garantir.) Pensando a respeito, eu lembrei que eu li num blog outro dia o autor se desculpando pelo que ele chamava de hiato nos posts, mas justificando que a vida dele andava boa demais para escrever.
Continuei refletindo e cheguei à conclusão de que, de fato, eu não pararia a jogatina e comilança do “dia de tristeza” (que foi um dos mais divertidos da faculdade) para postar aqui. Não diria para a Camila, “não, não Mims, depois a gente joga tênis de mesa”, para escrever este post ou qualquer outra coisa.
Porque a felicidade amortece, deixa a gente acrítico. Não que isso seja um problema, mas ocorre. E ser triste não é exatamente ruim, se se encarar por este ângulo. Chego a dizer que é até saudável.
A seqüência deste pensamento é que só quando a gente está triste é que tem força e vontade para mudar as coisas. E, por sua vez, a seqüência deste último pensamento é que, no mais das vezes, se as coisas mudarem, elas podem ser melhores.
Eu desenvolveria o assunto, para dizer que talvez a felicidade seja mesmo uma grande utopia, já que acabei de afirmar que mudar pode fazer a conjuntura melhorar, mas não vou, primeiro porque eu não acredito nisso e segundo porque a idéia era fazer um post curto.
Ao invés disso, vou me valer da conclusão a que eu e a Má já chegamos há anos, quando a gente ainda era girinos: felicidade é uma questão de adaptação. Uso essa frase feita, e fecho o raciocínio antes que vocês percebam que ele está furado e caiu no vazio.
No mais, depois de tanto suspense, revelo qual era o trecho da música no qual eu estava pensando:
“para fazer um samba com beleza,
é preciso um bocado de tristeza,
é preciso um bocado de tristeza,
senão não se faz um samba não”.
Não se faz um samba, nem um post. Não se faz nada sem tristeza.
(Nem tão curto, nem tão profundo, mas altamente epifânico.)

4.11.08

Ontem também, um amigo meu, novo no Facebook, me mandou um convite de uma application cujo mote era mais ou menos assim: “virtual tree. Send it to all your friends. One by one, we can save the world from global warming”.
Tive que recusar. Puta convite sem sentido do caralho. Chega a ser ultrajante!
Quem foi o cuzão, a mente perversa e perigosa, que sentou um dia na frente do computador e decidiu clicar no botão “create application” para fazer um monte de arvorezinhas virtuais disfarçadas de boa causa?
Se eu achar esse cara, nele baterei com um taco de beisebol. Porque pensa... esse mínimo de atitude pode ser exatamente a resposta de que algumas pessoas precisam para sentirem que estão “fazendo alguma coisa” pelo planeta. E culpa de quem? Da mente perversa e perigosa!
Gente, fiquei passada! Tudo bem que aqueles que aceitam este tipo de convite não devem jamais, não podem, pelo bem da sociedade, ser confundidos com aqueles que plantam árvores e não usam mais sacolas plásticas, por exemplo. Mas daí eu - radical como às vezes sou nos meus posicionamentos - não sei se os aceitantes deveriam sequer ter o “direito” de se sentirem bem, que é o que a app faz com eles.
Ok, ok. O que eu faço? Bom, eu não uso sacolas plásticas. Acho o máximo do glamour ter uma shopping bag, mesmo que isso implique contato excessivo da carne moída com o lustra-móveis.
Pena que eu não vou muito ao supermercado.
Bom, eu sempre imprimo tudo o que posso em rascunho no escritório e faço as minhas anotações num bloquinho feito de papel reciclado. E fecho a torneira enquanto ensabôo a louça.
Agora, essas ações simples, sem nenhuma pretensão de parecer mais politicamente correta do que eu sou (o que, aqui entre nós, com duas ou três mentirinhas seria muito fácil), me permitem tripudiar de quem aceita convites para salvar o mundo com árvores virtuais, o que me leva inexoravelmente ao pensamento que eu estou tentando afastar de que se pá a humanidade está mesmo perdida.
Obviamente, esse meu amigo achou que eu estava apenas sendo arrogante e antipática, que provavelmente é a imagem que ele tem de mim mesmo. Mas tudo bem, acho que ele ainda me curte, mesmo assim. E agora acho que a sementinha está plantada (a do amor fraternal dele por mim, não a da árvore virtual. Droga! Detesto não resistir a piadas ruins!).
De todo modo, é para desconfiar de quem repassa convites para que plantemos árvores virtuais. E na boa... meu coração não é terra improdutiva, não vem querer cultivar nada nele não!
Ontem eu estava zapeando notícias no meu google reader e percebi que, mesmo com a eleição americana pegando fogo, a crise financeira mundial bombando e o mundo caindo aos pedaços, todas as notícias que eu tinha separado para ler eram - sob um determinado ponto de vista - inúteis.
Tratavam de curiosidades ou de assuntos paralelos a estes grandes temas. Nenhuma delas tinha qualquer relação com os medos que afligem a sociedade atualmente, nem falava de rumos da economia ou política.
Eu me dei conta disto no exato momento em que cliquei numa reportagem cuja manchete era algo do tipo “garota de 13 anos morre apedrejada na Somália após denunciar estupro”.
Tudo bem, eu vou ter que concordar com quem quer que diga que ler esta notícia foi o último de uma grande sucessão de erros. Obviamente, o primeiro erro foi a morte da menina. Não, não. Foi ela ter sido estuprada. Não, definitivamente o primeiro erro da cadeia foi algum doente ter pensado em fazer sexo com uma menina de 13 anos contra a vontade dela.
E vai ladeira abaixo a partir daí: o sexo forçado, (me recuso a dizer que a denúncia por parte dela foi um erro), o casamento forçado, a acusação de adultério, a morte por apedrejamento na frente de 1000 pessoas que assistiam a tudo num estádio de futebol. Mas não pára. Tem ainda a repercussão internacional com a mobilização a posteriori de entidades de direitos humanos, a publicação destes fatos num jornal que eu leio (eu sei que se pá eles têm o dever de publicar, mas eu não ligo de dizer que isso foi um erro, ou pelo menos o modo pouco humano como se tratou da questão) e, por fim, eu ter escolhido esta notícia para ler.
Eu sei que estou me arriscando em terreno perigoso. Se pá, na Somália, quem ainda não deu aos 13 já está velha e virou uma árvore seca. Não tenho como saber. Ainda assim, tenho a impressão de que ser acusada de adultério e ser apedrejada em público não é legal (no sentido de bacana, não no sentido de “condizente com a legalidade”) em lugar nenhum do mundo.
Daí eu me revoltei. Confesso que não foi uma revoltooona, mesmo porque eu acabei me distraindo com outros pensamentos e tarefas ontem, quando deveria de fato ter escrito sobre isso. (Quero dizer que se isto estivesse me atormentando muito, eu não teria esquecido.)
Ocorre que, quando você não está se sentindo a melhor das pessoas (Felipe Massa, laranjas, braço doendo e todo o resto), a menina morrer na Somália pode vir a te ferrar.
E me ferra, porque, apesar de eu ter escolhido o direito por pensar que podia fazer alguma diferença e corrigir certos desvios, eu estou aqui no confortinho da minha cama e a menina virou poeira cósmica.
Manipulada pela mídia? Muito provavelmente. Eu vivo sendo manipulada pela mídia. Outro dia eu me rachei de rir quando descobri que o pai da Eloá era um bandido foragido e a mãe dela seqüestrou aquele irmão mais velho dela lá para fugir para São Paulo e viver essa vida honesta e sincera que eles levavam até outro dia, quando o Lindemberg (“maior vilão” da história) resolveu surtar. O pai do moleque está há anos em Maceió lamentando a perda do filho, mas não tinha coragem de ir à polícia, por quê? Porque o pai da Eloá é bandidão, mano! Com medo!
Eu sei que ninguém merece ficar vendo a filha ser maltratada e depois morta por um louco, nem estou tirando os méritos do Lindemberg (sim, sacana, sim, louco, sim cuzão) mas vamo combiná: a galera ali muito não é flor que se cheire. E foi essa família de criminosos que mexeu com os sentimentos do Brasil, fez com que algumas pessoas (desocupadas, mas nem por isso menos seres humanos) saíssem das suas casas para chorar em frente às câmeras da TV e dizer que “perder a Eloá é como perder uma filha” e que mobilizou 30.000 indivíduos para acompanhar o féretro da menina.
Essa historinha que eu contei me permite chegar a duas conclusões básicas: 1. O fato de eu ter conseguido rir demonstra que eu não sou assim tããão manipulada pela mídia; 2. A mídia faz o que quiser com a cabeça da massa.
Eu sei, eu sei. Clichezão. Mas eu ainda não estou tão boa assim de escrever, quem sabe com a prática melhora.
E a verdade é que a melhor vertente para desenvolver esse texto seria falar sobre como acontecimentos semelhantes a este da Eloá despertam os mais variados e intensos sentimentos em pessoas que sequer a conheceram, e o porquê disso.
O problema é que para falar disso aí precisa de (i) tempo; (ii) coragem e (iii) conhecimento. Não tenho nenhum dos três, mas prometo que assim que eu conseguir a coragem, eu escrevo, nem que seja para dizer bobagem.
Mas o meu ponto, lá atrás, antes de eu me perder em devaneios, era: para a menina da Somália, de que adianta eu fazer direito?

Parece que todo mundo tem alguma coisa a dizer

Tudo começou no último domingo, dia inútil por definição que não fugiu à regra. Mas aconteceram várias coisas que foram me deixando triste, aos pouquinhos. E aí veio esta vontade de escrever que, segundo já me disseram algumas vezes, não deve jamais ser ignorada.
Felipe Massa perdeu o campeonato mundial de Fórmula-1. E eu, que nem ligo tanto para esse esporte, tinha ficado muito contente com a perspectiva de que ele ia ganhar, mas tomei um tombo.
Meu braço direito está doendo de um jeito que não está escrito em lugar algum, porque eu carreguei a Camila no colo ontem mais do que eu deveria e ainda joguei Wii.
Por fim, Mariana me fez ler artigos e ver um vídeo que me fizeram chegar a esta conclusão que dá nome a este... hum... texto... parece que todo mundo tem alguma coisa a dizer!
Os artigos falavam sobre os desafios de uma mulher solteira e bem-sucedida profissionalmente que foi morar sozinha no Rio de Janeiro. Sobre como ela sente vontade de dar, mas não pode, e como existem certas condutas que as pessoas adotam que são absolutamente ridículas.
Num dia normal, eu não teria achado nada demais. Na verdade, eu nem achei, mas gostei de como ela escreve porque ela não tem medo de falar caralho e chamar de filho da puta quem merece. Convenhamos, gordas em sapatos de salto com calças apertadérrimas e calcinhas minúsculas são umas mal-comidas ridículas e alguém tem que dizer isso a elas. Ou dizer, apenas.
O vídeo tratava dos pensamentinhos que a gente tem quando criança, mas que acaba reprimindo e depois esquece. Lembrei daquela passagem do Pequeno Príncipe (eu consultaria para escrever direito, mas o meu está com o André, em Portugal) em que o autor desenha a cobra que comeu o elefante e todo mundo diz que é um chapéu, o que faz com que ele acabe desistindo de uma carreira artística potencialmente promissora.
O vídeo em si tinha muitas pretensões de ser fofo e acabou ficando meio irritante. De todo modo, havia bons conceitos ali. Por exemplo, se nada nessa vida é perfeito, por que existe a palavra “perfeito”?
Então assim, talvez eu tenha certas coisas a dizer também. Não, eu não acho que as minhas serão de alguma forma melhores do que as da mulher mal-comida do Rio (pois é, ela escreve bem, mas isso não muda os fatos), ou do que as de Saint-Exupéry. Não dá sequer pra garantir que serão melhores do que os pensamentos que supostamente povoam a cabeça das criancinhas do vídeo.
Mas eu preciso dizer. E vou dizer porque eu recebi tantos elogios sobre a forma como eu escrevo essa semana (foram três, mas acho que isso já me dá a legitimidade que eu preciso) que a vaidade subiu à minha cabeça.
Hoje foi dia de finados e amanhã faz 9 anos que meu avô morreu. Nove anos! Tipo, quase uma década inteira sem o sr. Celso. E eu penso nele todos os dias, como tinha que ser.
A morte dele representou um desespero tão intenso que eu realmente não sabia para onde olhar, o que fazer. Eu me senti traída por ter acreditado tão sinceramente que aquilo não aconteceria daquele jeito, naquele momento. A este respeito, eu poderia escrever muito, porque falar do meu avô é facílimo. Entretanto, transcrevo apenas o seguinte trecho de uma música que eu tenho ouvido bastante:
“Sorrow drips into your heart through a pinhole/ just like a faucet that leaks and there is comfort in the sound”.
A primeira vez que eu escutei esta letra eu não entendi qual era. Depois, pensando a respeito, eu percebi que se aplica à história da perda de alguém de quem se goste muito, pelo menos para mim.
Para explicar, acho que eu tenho que dizer que realmente tenho um problema com sons repetitivos. Buzinas, alarmes de carros que disparam, campainhas (de porta, de celular), tudo o que é som e repetitivo e não é música me tira do sério.
A explicação que eu tenho é que até aquilo que mais perturba, mesmo o que incomoda muito fica pequeno e até reconfortante quando se está diante de uma situação dessa.
Era isso.